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Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

O Laboratório das Relações entre Empresas e Direitos Humanos – Lardem da Clínica de Direitos Humanos da PUCPR, vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Direito (PPGD), fez um projeto “Mapeamento do Financiamento Privado nas Eleições Municipais de Curitiba”.

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De acordo como estudo, os valores arrecadados pelos candidatos à prefeitura de Curitiba para a campanha eleitoral de 2024 apresentam uma grande variação, refletindo as diferentes capacidades de captação de recursos entre os concorrentes. Uma questão relevante neste cenário é o papel das pessoas físicas doadoras, que possuem conexão com pessoas jurídicas em campanhas eleitorais. “No entanto, muitos candidatos ainda conseguem arrecadar grandes somas por meio de doações, como apoio de pessoas físicas ligadas ao setor empresarial ou contribuições feitas pelos próprios partidos. Embora a legislação brasileira tenha proibido doações diretas de empresas desde 2015, por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda é possível identificar um impacto das corporações privadas nos investimentos eleitorais”, afirma o estudo.

Ainda de acordo com o estudo, a dinâmica de financiamento empresarial, direta ou indireta, afeta o equilíbrio eleitoral entre os candidatos. Por exemplo, Eduardo Pimentel (PSD), que lidera com aproximadamente R$ 300.000,00, investido por pessoas física que possuem relações diretas com empresas. Citam-se também a candidata Maria Victoria (PP) e o candidato Ney Leprevost (União Brasil), este arrecadando mais de R$ 200.000,00 em doações de pessoas físicas que se relacionam com o setor privado.

Por outro lado, candidatos como Felipe Bombardelli (PCO) e Andrea Caldas (PSOL), não receberam financiamento de pessoas físicas vinculadas diretamente com empresas. Essa disparidade entre os candidatos, com referido apoio, evidencia uma significativa desigualdade na corrida eleitoral. Esta situação demonstra a insuficiência das proteções das Lei das Eleições e decisão do Supremo Tribunal Federal, em sede de ADI 4650/DF (2015), que visam garantir o tratamento isonômico entre os candidatos durante a disputa eleitoral.

“Alguns dos espantosos números, se rastreados a sua origem, indicam que grande parte das doações são provenientes de pessoas físicas as quais estão conectadas com empresas. Tal cenário denuncia um sistema que continua a favorecer candidatos com maior apoio e representação partidária, enquanto candidatos com menos recursos e contatos com o setor empresarial enfrentam desafios maiores para financiar e propagar suas campanhas”, afirma o estudo.

Como é o financiamento e qual o objetivo do estudo

O financiamento de campanhas eleitorais no Brasil desempenha um papel crucial para assegurar a integridade e transparência do processo democrático. O Supremo Tribunal Federal proibiu, em 2015, o financiamento de campanhas eleitorais por pessoas jurídicas, sob o argumento de que “a doação por pessoas jurídicas a campanhas eleitorais, antes de refletir eventuais preferências políticas, denota um agir estratégico destes grandes doadores, no afã de estreitar suas relações com o poder público, em pactos, muitas vezes, desprovidos de espírito republicano.” (ADI 4650). Assim, o Tribunal buscou assegurar a equidade no processo eleitoral e um mandato justo aos candidatos, eliminando a possibilidade de que o setor privado, por meio de seu poder econômico, interferisse nas decisões políticas.

A legislação eleitoral brasileira, em especial a Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) e as resoluções complementares do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), visa promover, entre os candidatos, justiça e equidade de oportunidade no processo eleitoral.

No tocante ao financiamento, ele pode ser público ou privado. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), criado pela Lei nº 13.487/2017, e o Fundo Partidário, regulado pela Lei dos Partidos Políticos (Lei nº 9.096/1995), são as principais fontes de financiamento público. A distribuição do Fundo Eleitoral se dá proporcionalmente ao número de representantes de cada partido na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, conforme os artigos 16-C e 16-D da Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997). Já o financiamento privado ocorre mediante doação de pessoas físicas, no limite de 10% da sua renda bruta auferida no ano anterior à eleição, conforme dita o artigo 23, §1º, da Lei das Eleições.

Nesse contexto, o estudo sobre o financiamento privado das campanhas para a prefeitura de Curitiba em 2024 ilustra como essas normas afetam o processo eleitoral. Desta forma, o objetivo do projeto é transparecer a conexão entre as doações de pessoas físicas realizadas aos candidatos à prefeitura de Curitiba durante as eleições municipais de 2024 e empresas privadas, demonstrando a deficiência que tanto a legislação quanto a decisão do Supremo possuem na proteção da igualdade de oportunidades na campanha eleitoral. A presente pesquisa foi atualizada em 04/10/2024 e está sujeita a futuras modificações, dependendo das circunstâncias e informações relacionadas a cada candidato.

Até o presente momento, os dados arrecadados demonstram uma disparidade significativa entre os candidatos a prefeitura em Curitiba, como segue a seguir:

Eduardo Pimentel (PSD) lidera com R$ 12.391.884,19, dos quais 97% (R$ 12.071.884,02) foram repassados pelo partido. Além disso, ele recebeu doações do Rubens Slaviero, o qual é empresário da Cia de Cimento Itambé, no valor de R$ 230.000,00, e R$ 40.000,00 do empresário-sócio Jefferson Melhim do Grupo Rejaile, além de outros doadores que contribuíram com R$ 10.000,00, como Everton Lopes Arantes, sócio da Prime Control, e Orlando Otto Kaesemodel Filho, sócio da Oelo Locadora de Equipamentos Eletrônicos LTDA, ambas do ramo de tecnologia.

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Ney Leprevost (União Brasil) arrecadou um total de R$ 9.001.058,45 para sua campanha, sendo a maior parte desse montante (R$ 8.772.600,00) proveniente da Direção Nacional de seu partido. Entre as doações recebidas, destacam-se os R$ 150.000,00 do empresário Fabricio Maggi Schimidt, sócio das empresas Wood’s Casa de Show e Agropecuária Maggi. Além disso, o Presidente do Conselho, Raul Fernandez Schuchovsky, e a CEO, Tatiana Schuchovsky Reichmann, ambos representantes da empresa Ademilson Administradora de Consórcios S.A., contribuíram com R$ 15.000,00 cada.

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Luciano Ducci (PSB) levantou R$ 8.180.181,70, com 79,7% (R$ 6.517.045,00) provenientes de recursos próprios. Doações individuais também foram recebidas de André Silva de Oliveira e Diego Andreguetto Orasmo (R$ 5.716,34 cada), que trabalham junto com o candidato em seu gabinete como Deputado Federal e em sua campanha eleitoral.

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Maria Victoria (PP) arrecadou R$ 4.536.000,00, sendo a maior parte (R$ 3.930.000,00) da Direção Nacional do PP. Outras contribuições vieram de  Rubens Ometto Silveira Mello (R$ 200.000,00), que é presidente da empresa M.Haus Empreendimentos Imobiliários S.A, Fernando dos Santos Andrade Cavalcanti (R$ 200.000,00), sócio-administrador da NW Consultoria Negócios e Soluções Ltda., e Diego Caetano da Silva Campos (R$ 100.000,00), esposo da candidata e sócio do escritório de advocacia Diego Caetano da Silva Campos – Sociedade Individual de Advocacia.

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Cristina Graeml (PMB) arrecadou R$ 190.648,70, sendo a maior doação de R$ 17.094,90 de Beatriz Chiavegatti Amorese, empresária da CN TECNOLOGIA.Outras contribuições vieram do engenheiro Ednilson Novo Hausen (R$ 10.000,00), sócio da Eleng Engenharia, e Daniel Martins Amorese (R$ 8.621,70), também proprietário da empresa individual Daniel Martins Amorese, e pela advogada Marcela Cristina Tezolin (R$ 5.000,00), sócia titular da Paese & Tezolin Advogadas Associadas. Possui também outras doações privadas com menor valor expressivo.

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Andrea Caldas (PSOL) obteve R$ 238.075,00, dos quais 99,3% (R$ 237.500,00) vieram do partido. A única doação adicional foi de R$ 1.665,00 da plataforma de financiamento coletivo (crowdfunding) “queroapoiar.com.br”, homologada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para funcionar.

Roberto Requião (Mobiliza) arrecadou R$ 131.311,17, dos quais R$ 80.000,00 (57%) são provenientes de recursos próprios. Ele também recebeu contribuições de Rafael Xavier Schuartz e Luiz Gustavo Petrini Polati, funcionários públicos, nos valores de R$ 18.000,00 e R$ 9.000,00, respectivamente. O empresário Rogério Wallbach Tizzot, sócio da empresa RTA Engenheiros Consultores, doou R$ 10.000,00, além de outras contribuições menores.

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Samuel de Mattos (PSTU) arrecadou R$ 46.685,00, com a maior parte (R$ 41.400,00) vinda da Direção Nacional de seu partido. Doações menores vieram de Ana Carolina dos Santos (R$ 2.500,00) e do próprio candidato (R$ 2.035,00).

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Luizão Goulart (Solidariedade) levantou R$ 472.500,00, com 93% (R$ 438.825,00) provenientes do partido. Além disso, recebeu contribuições individuais de Marly Paulino Fagundes (R$ 25.000,00), Deputada Estadual do Paraná, e Ricardo Augusto Pinheiro (R$ 10.000,00), Secretário de Desenvolvimento Econômico da Prefeitura de Pinhais.

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Felipe Bombardelli (PCO) foi o único candidato que não recebeu nenhum financiamento de pessoas físicas que tenham vinculação a empresas. Esta situação é decorrente do posicionamento do candidato nas relações econômicas, bem como o desinteresse de indivíduos com conexão empresarial em apoiar a sua campanha.