Franklin de Freitas – Vigand Olsson: rádioamador há mais de 40 anos no Paraná

Aos 73 anos de idade, o teuto-brasileiro Vigand Olsson é testemunha de um tempo que pode ser conjugado no pretérito mais-que-perfeito. Em sua infância, numa época em que celular era coisa de ficção científica e a televisão, um artigo de luxo, a principal distração da família, que vivia no interior de Santa Catarina, era o rádio. “Rádio na cabeceira da cama, rádio na sala, em cima da mesa… À noite a gente se reunia e escutava o rádio, a gente escutava muitas estações da Alemanha”, recorda ele.

Ocasionalmente, contudo, conversas estranhas interferiam no lazer da família. Curioso, o pequeno Vigand perguntava ao pai o que era aquilo. “E ele dizia que era o radioamador”.

Depois da curiosidade, a paixão. Nos anos 1980, influenciado pelo Rádio Cidadão, Vigand resolveu entrar no mundo do radioamadorismo. E nunca mais saiu. “Desde 1980 até hoje estou ativo. Agora, aposentado há um ano, dedico mais tempo. Não existe limites no radioamadorismo”, conta Olsson, que é conhecido por muitos não pelo seu nome, mas por um código, chamado de indicativo de chamada e que é, basicamente, sua identificação como radioamador.

“Em 1980, ainda era a época militar, o indicativo era distribuído. Eu não podia escolher o indicativo, pegava o da vez. E na vez era PY5QW, que até hoje tenho. Ele me identifica, é minha identificação.”

Em décadas de dedicação ao radioamador, as ondas emitidas por Olsson atravessaram o mundo todo, bem como ele também recebeu ondas de todos os cantos. Literalmente. Ao todo, são 315 países contatados, de todos os continentes e zonas do planeta. “Só este ano eu já tenho 174 países contatados de 39 zonas. Todos os continentes são um quadrado em zonas, com 40 zonas ao total nos continentes. Só falta a zona 29, ao lado da Austrália, aonde não tem muita atividade de radioamadorismo”, conta ele, orgulhoso.

Rivalidade

‘A internet é um concorrente forte’
No Paraná, existem hoje 2.109 pessoas (naturais e jurídicas) autorizadas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) a explorar o Serviço de Radioamador, que está presente em 158 dos 399 municípios paranaenses (39,6% do total). A principal concentração de radioamadores está na RMC, com um total de 921 autorizadas e presença em 17 dos 29 municípios (58,6%) que compõem a região metropolitana. Já se considerados os dados por município, Curitiba, com 674 autorizadas, aparece na liderança, seguido por Ponta Grossa (112), Foz do Iguaçu (108), Cascavel (107), Londrina (104), Umuarama (66), Maringá (64) e Dois Vizinhos (60).

Até pouco tempo atrás, entretanto, o número de radioamadores no estado era ainda maior. Uma reportagem publicada em setembro de 2007 na Folha de Londrina e assinada pelo jornalista Fábio Galão, por exemplo, informava, com base em dados da Liga de Amadores Brasileiros de Rádio Emissão (Labre-PR), que havia 1.058 autorizadas em Curitiba e aproximadamente 3,2 mil no Paraná. Em 13 anos, então, houve uma queda de 34,4% no número de radioamadores no estado e de 36,3% na capital – redução de um terço, praticamente.

Presidente da Associação dos Radioamadores do Paraná (ARPA), Vigand Olsson admite que ‘não está fácil’ fomentar o radioamadorismo nestes tempos de wi-fi, 5G e redes sociais. Noutros tempos, os grupos de escoteiro serviam como grandes incentivadores do hobby, ensinando aos jovens sobre o uso do rádio. Hoje, porém, a prática está em baixa.

“Em todas as atividades que existem, sempre têm altos e baixos. Hoje estamos meio paradões, falta dar uma agitada. Mas as próprias associações, a Labre, os clubes que têm, precisariam ter mais incentivo e também incentivar mais. Estamos atravessando um momento difícil. Talvez seja até a era da modernidade, a internet é um concorrente forte. Para que uma antena tão grande se pelo Skype eu falo com o mundo todo?”, comenta.


Da amizade ao socorro
Vigand Olsson conta que costuma sentar na frente do rádio e ligar o computador para acessar a internet e verificar quais radioamadores estão online mundo afora para tentar contato. “Se é um país novo, queme interessa, me dedico a fazer esse contato. Ou encontra uma pessoapara bater um papo, trocar ideias”, conta o radioamador, que em décadas fez inúmeras amizades pelo mundo.

“Como falo alemão, tenho muitos amigos na Alemanha, alguns até já vieram aqui nos visitar. No radioamadorismo, são duas coisas que não se fala: política e religião. Mas no mais, se fala bastante da região, se procura saber um pouco mais da cultura, etc. Sempre tem assunto”, diz Olsson.

Para além do lazer, entretanto, até hoje o radioamadorismo mantém uma função importante, auxiliando a Defesa Civil nas mais diversas situações. “último exemplo aconteceu aqui foiquando desceram osmorros no litoral do Paraná. Um grupo do nosso pessoal foi com Jeep lá, levaram mantimentos e montaram uma estação-base para apoiar os bombeiros”, recorda o presidente da ARPA. “Se acontecer um dia evento de tudo sair do ar, o radio amador não sai do ar. Com a bateria transmite e recebe mensagens”, finaliza.

Como virar um operador?
No Brasil, o serviço de radioamador é regulamentado pela Anatel, que concede autorizações àqueles interessados em operar o serviço de telecomunicação para treinamento próprio, intercomunicação e investigações técnicas. Os interessados, então, devem fazer prova para avaliação de conhecimentos técnicos para conseguir uma habilitação, sendo que existem três classes diferentes de Certificado de Operador de Estação de Radioamador (COER): C, B e A, aqui apresentadas em ordem crescente. Mais detalhes sobre a prova e o passo a passo para se tornarum radioamador podem ser conferidos no site da Anatel (https://www.anatel.gov.br/setorregulado/radioamadorismo).

Um dos grandes problemas, contudo, é o preço dos equipamentos. Com as taxas de importação, um produto que custaria 1,5 mil dólares, por exemplo, chega ao Brasil custando 3 mil dólares, ou seja, o dobro. O que facilita,por outro lado, é a comunicação e a troca entre os próprios radioamadores, conforme explica Vigand Olsson. No site da ARPA (www.arpapr.org.br) e da Labre-PR (www.labre-pr.org.br), inclusive, há seções específicas voltadas para a troca evenda de produtos entre radioamadores, o que pode facilitar a vida dos curiosos que querem ingressar no mundo do radioamadorismo.


SAIBA

Dia nacional do radioamador
Em todo o país, o dia 5 de novembro marca o Dia do Radioamador Brasileiro, em celebração à publicação do Decreto nº 16.657 de 1924, que regulamentava as estações de radioamadores do Brasil (que atéentão eram clandestinas). Até 1968, porém, a celebração acontecia anualmente em 22 de outubro, quando foi feita a primeira sessão da Assembleia Geral dos Radioamadores Paulistas e Cariocas, que fundiram suas entidades e criaram a LABRE – Liga de Amadores Brasileiros de Rádio Emissão. A fixação do 5 de novembro, por outro lado, aconteceu após meticuloso trabalho de pesquisas realizado pelo radioamador João Ramos Bacaratt (PY2AJ),que levou suas descobertas para o Conselho Federal da Labre, que em outubro de 1968 estava reunido em Curitiba e decidiu por alterar a data da celeração para 5/11, em homenagem ao referido decreto.