São Paulo, 04 (AE) – Luc Besson reluta em admitir quanto Arthur, de”Arthur e os Minimoys”, tem dele mesmo. Questionado, diz apenas que,como ele, Arthur viveu a infância nos anos 60, brincando no jardim. Écom essa quase autobiografia que o diretor parisiense pretende encerrarsua carreira, aos 48 anos – ele já pensa que só voltará a filmar se forpara fazer a seqüência de “Arthur”. Após causar impacto com filmes como”O Profissional”, “Nikita” e “O Quinto Elemento”, Besson passou osúltimos sete anos envolvido nesse projeto infantil e poético, que passalonge da dose cavalar de adrenalina que costumava levar para a tela.

Ele justifica a mudança com a tese de que agora é hora de fazer carinhona sociedade. Na época de “Nikita”, por exemplo o tempo era de chocar asociedade. “Arthur e os Minimoys” consumiu 65 milhões de euros e ébaseado nos livros infantis escritos pelo próprio Besson. Misturaatores reais com animação 3D, para contar a história de um garoto querecorre a seres mágicos do jardim para ajudar a saldar as dívidas dafamília. É um infantil diferente, pois não faz concessões, não trata ascrianças com infantilismos. “Quero que o filme seja como o primeirofilme adulto da vida de uma criança”, diz. Em passagem rápida por SãoPaulo, no mês passado, Besson, pai de cinco filhos entre 1 e 20 anos,conversou com a reportagem.

AGÊNCIA ESTADO – Foi bom ou ruim não ter experiência em animação para fazer esse filme?

LUC BESSON – Nem pensei nisso. Na verdade não tive escolha. Não é umverdadeiro filme de animação. “Arthur e os Minimoys” começa como umfilme normal, um garoto e um jardim; depois ele fica com doismilímetros e foi preciso encontrar uma solução para filmar. A animaçãoem 3D me pareceu a melhor. Se fizesse esse filme há 30 anos, teriaconstruído cogumelos e flores gigantes no set, e usado atores deverdade com próteses pontudas na orelha.

AE – A questão ambiental passa de maneira sutil no filme. Qual o peso que você lhe dá na história?

BESSON – É muito importante esse assunto e temos de falar sobre elepara as crianças agora, enquanto ainda são crianças. É interessante,porque parece que neste ano há uma tomada de consciência geral. E eucomecei esse filme há seis anos, e estou muito feliz de lançar o filmeagora. É uma mensagem a mais. Hoje é importante falar sobre isso todosos dias, porque é a vida do planeta que está em jogo. É importantepedir aqui no Brasil, por exemplo, que parem de cortar árvores.

AE – Esta é sua primeira vinda ao Brasil?

BESSON – Não. Mas quando vim, há sete anos, havia mais árvores. Há umprovérbio dos índios norte-americanos que diz que quando o homem cortara última árvore da Terra, ele vai entender que dinheiro não se come.

AE – Quanto há de você em Arthur?

BESSON – Hum, 48,3%… É um garotinho que tem 10 anos nos anos 60, e eutinha essa idade na época. É muito agradável lidar com essaslembranças. É um garoto filho único, como eu era. Como acontecia commuitos garotos, quando meus pais estavam ocupados me mandavam para acasa da minha avó. Não havia videogame, internet. A gente ia para ojardim, fazer obstáculos para desmanchar a trilha das formigas.

AE – Meu irmão também fazia obstáculos para as formigas.

BESSON – As crianças são iguais em qualquer parte do mundo, éinteressante. Estou visitando 28 países, e em todos eles peço queorganizem sessões para crianças, para eu sentir o que estão pensando. Areação delas, seja aqui, na China ou na Europa, é a mesma. Não queremsaber quanto o filme custou ou qual a minha motivação ao fazê-lo. Jádos adultos, você pode esperar qualquer coisa.

“…A CRÍTICA É O ESPECTADOR QUE FAZ”

AE – Você produziu o filme “Federal”, de Erik de Castro. Por que veio investir no cinema brasileiro?

BESSON – Meu escritório recebe cerca de 900 roteiros por ano. “Federal”me pareceu um bom projeto e o diretor é bom. Deu vontade de participar.Não houve nenhuma outra ambição, as pessoas geralmente pensam que aintenção é invadir o mercado dos outros. Se o diretor fosse finlandês,minha produtora investiria da mesma forma.

AE – Quando fez filmes como “O Quinto Elemento” e “Joana d’Arc” chamoua atenção o tamanho das produções, fora dos padrões franceses, e chegoua ser chamado de hollywoodiano. Já fez as pazes com a crítica francesa?

BESSON – Você está confundindo duas coisas. Os filmes são feitos paraas pessoas, os espectadores. Nós precisamos dos jornalistas parainformar, mas a crítica é o espectador que faz. E eu tenho contato commeus espectadores. Quando eles não gostam de um filme, são muitoeducados. Não têm maldade ou ciúme.

AE – Selenia, a princesa do filme, é uma criança minimoy, e é quase tãosensual quanto a garota de “O Profissional”. Como lida com isso, hádecisão consciente de sexualizar a infância?

BESSON – Qual é o problema? Para mim, mais preocupante é o jornal quepassa na TV. Ali a gente vê o cinismo das pessoas, que estão se matandopor dinheiro e petróleo. Quanto às mulheres bonitas, não importa aidade, elas estão em toda a parte, basta olhar na rua. E não é possívelque seja um problema mostrar coisas bonitas! Se fosse, todas asmulheres deveriam usar burca. Imagine, você vindo me entrevistar deburca.