Deve-se dizer “deixem as crianças brincar” ou “brincarem”? Tanto faz. Vejamos por quê.


 


Na coluna Não Tropece na Língua 049 observamos como funciona o infinitivo pessoal flexionado: com flexão optativa [convidou as crianças para brincar/brincarem no pátio] ou obrigatória [refo! rmou o pátio para as crianças brincarem à vontade]. Um passo além disso é conhecer e aplicar corretamente o infinitivo nas frases elaboradas com os verbos “ver, ouvir, sentir, fazer, mandar, deixar”. Se o complemento desses verbos f! or um substantivo, será optativa a flexão; mas se o complemento for um pronome pessoal oblíquo, a flexão será proibida. Exemplos:


   


Complemento substantivo    /   Complemento pronome


 


Viu os meninos pular/pularem o muro./ Viu-os pular o muro.


Ouvi os gatos arranhar/arranharem a porta. / Ouvi-os arranhar a porta.


Não sinto os corações bater/baterem. / Não os sinto bater.


Faça os alunos ficar/ficarem quietos. / Faça-os ficar quietos.


Vou mandar as meninas entrar/entrarem. / Vou mandá-las entrar.


Deixou as duas ficar/ficarem descalças./ Deixou-as ficar descalças.


 


Os verbos ver, ouvir e sentir (e sinônimos) são chamados de sensitivos; fazer, mandar e deixar, de causativos ou factitivos.


 


Qual a melhor opção do redator?


 


1) Preferentemente, não flexionar quando o infinitivo vem logo depois dos verbos sensitivos e causativos:


 


O papel da imprensa é fazer circular as informações.


 


“Deixai vir a mim as criancinhas.”


 


Francisco Braga demonstrou sua inclinação para a música fabricando instrumentos rústicos de bambu, nos quais imitava trechos que ouvia executar os seus colegas mais velhos.


 


2) Quando o infinitivo é um verbo pronominal (com o pronome SE), a preferência é pela flexão:


 


O fato é que pelo país afora vemos esses hospitais se afundarem em dívidas e mostrarem-se incapazes de se equipar.


 


O joalheiro vê multiplicarem-se os pedidos e o faturamento da firma.


 


O cinegrafista ainda conseguiu ver as mãos se soltarem do gradil.


 


Mas devo repetir: em qualquer circunstância, basta haver um pronome oblíquo para que não se possa pluralizar/flexionar o infinitivo:


 


Mande-as entrar, por favor.


 


“Não nos deixeis cair em tentação.”


 


Faça-os calar imediatamente.


 


Nós os ouvimos fechar a porta de mansinho.


 


O cinegrafista as viu se soltar do gradil.


 


Lula sempre nos deixou falar. [Erro gramatical: “nos deixou falarmos”]


 


Nos demais casos, a escolha é pessoal, talvez até uma questão de ouvido:


 


O que faz certas regiões ser/serem mais populosas que outras?


 


O jacaré deixou os patinhos e todo mundo nadar/nadarem na lagoa.


 


Não há advogado que faça esses baderneiros respeitar/respeitarem a lei.


 


Os surtos de dengue e febre amarela fizeram os indicadores de saúde pública brasileira retornar/retornarem ao início do século.


 


Ficava observando, olhando as formigas carregar/carregarem pedaços de folhas de um lado para o outro.


 
* Maria Tereza de Queiroz Piacentini Diretora do Instituto Euclides da Cunha e autora dos livros ‘Só Vírgula’, ‘Só Palavras Compostas’ e ‘Língua Brasil – Crase, pronomes & curiosidades’ – www.linguabrasil.com.br