Livro conta ‘a trajetória do maior jornal de economia do País’

Estadão Conteúdo

Melhor, mais importante e mais admirado jornal de economia do Brasil durante décadas, a Gazeta Mercantil pereceu por falhas administrativas tão graves quanto aquelas detectadas em outras empresas por seus analistas e repórteres. Com problemas financeiros crescentes, mas subestimados por seu controlador, o jornal se consumiu lentamente, enfraquecido pelo endividamento, pela receita declinante e pelo esboroamento de uma excepcional equipe de jornalistas. Ex-integrante dessa equipe, Célia de Gouvêa Franco narra de forma desapaixonada, em capítulos curtos e sem enfeites, a história dessa experiência jornalística, iniciada nos anos 1970 encerrada em 2009, quando o jornal parou de circular.

O título do livro é preciso, embora adjetivado: Gazeta Mercantil – A Trajetória do Maior Jornal de Economia do País. A narrativa começa em 1973, quando um boletim especializado em pequenas notícias financeiras e em registros de protestos, falências e concordatas, foi convertido num jornal destinado a cobrir mais amplamente o mundo das empresas e dos negócios. O dono do boletim era Herbert Levy, banqueiro, fazendeiro, empresário e político (deputado federal) ligado à UDN, um dos principais partidos conservadores do período anterior à ditadura militar.

Herbert Levy e seu sucessor, o filho Luiz Fernando, proporcionaram as condições financeiras para a conversão do velho boletim num jornal ambicioso e produzido por bons profissionais. Os dois, segundo jornalistas citados no livro, evitaram intervir na produção e na orientação da Gazeta, respeitando de forma constante o trabalho jornalístico. Ambos, no entanto, já tinham a intenção de modernizar e fortalecer o velho boletim e nisso coincidiram com a equipe mobilizada para o trabalho.

Com apenas 173 páginas, o volume produzido por Célia Gouvêa Franco é duplamente interessante. Narra a história de um respeitado jornal econômico, produzido com admirável competência, e desenha, como cenário, as condições econômicas e políticas do País, desde os anos 1970 – período da ditadura militar – até o início deste século, quando a Gazeta foi fechada.

Não se trata, portanto, de uma leitura de estrito interesse profissional, destinada a um público ligado ao mundo da comunicação. É também uma fonte de dados sobre a formação do Brasil contemporâneo, refletida na história de um jornal voltado principalmente para a economia e a política. A palavra “principalmente” é uma restrição importante, porque a Gazeta Mercantil foi também, por muitos anos, uma relevante fonte de informação cultural.

Célia de Gouvêa Franco também trabalhou na Gazeta. Conheceu diretamente, portanto, o objeto de seu livro, mas nem por isso julgou dispensável ouvir as histórias e opiniões de fontes importantes. Também nesse cuidado a autora do livro seguiu o padrão de uma jornalista experiente e cuidadosa.

Célia foi casada com Celso Pinto, repórter, editor e colunista da Gazeta e da Folha de S.Paulo. Considerado um dos melhores jornalistas de seu tempo e falecido em 2020, foi ainda o criador do jornal Valor Econômico. Para quem o conheceu e acompanhou seu trabalho, foi uma referência profissional, um padrão de medida para a avaliação da atividade jornalística. O livro agora publicado por sua mulher é também, certamente, um tributo à sua memória, apesar da discrição e da quase impessoalidade encontradas em cada capítulo e em cada relato ou comentário incluído em suas páginas.

Gazeta Mercantil: A trajetória do maior jornal de economia do País

Autora: Célia de Gouvêa Franco

Editora: Contexto (173 páginas, R$ 45)