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Oportunidades: nem-nem ou sem-sem (Foto: Paulo Pinto/ABr)

Um estudo do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), faz um questionamento sobre os jovens que não estudam nem trabalha: eles seriam “nem-nem ou sem-sem”? Veja a seguir:

No segundo trimestre de 2024, estima-se que mais de 9,8 milhões dos jovens entre 15 e 29 anos (20%) estavam sem trabalho e fora da escola, os chamados, por alguns, de nem-nem. Mas por que eles estavam nessa situação? Faz sentido chamá-los de nem-nem?

A maior parte dos chamados nem-nem não está na ociosidade. Na verdade, está procurando trabalho, lidando com afazeres domésticos (casa, filhos ou parentes) ou realizando cursos não regulares. Apenas 7% dos jovens não estavam envolvidos nessas atividades.

Em geral, as estatísticas relacionadas aos chamados nem-nem no Brasil consideram como fora da escola qualquer jovem que não esteja no ensino “regular” (fundamental, médio ou superior), mas não consideram como estudante quem está matriculado, por exemplo, em cursos pré-vestibulares ou de treinamento.

A ideia de que os jovens estão nessa situação por falta de vontade de trabalhar ou de estudar não se aplica na maior parte dos casos. Há evidências de que, em geral, essa é uma condição transitória.

Algumas estatísticas sobre o 2° trimestre de 2024 mostram a seguinte realidade:

-Apenas 1,4% dos jovens afirmaram que realmente não queriam trabalhar.

-23% dos jovens sem trabalho e fora da escola tinham procurado ativamente trabalho no mês em que foram entrevistados pelo IBGE

-12% das mulheres declararam que não podiam trabalhar porque tinham que cuidar de afazeres domésticos – ou seja, na verdade, estavam trabalhando, mas não são consideradas como força de trabalho

-8% dos jovens sem trabalho e fora da escola faziam algum tipo de curso ou estudavam por conta própria.

É preciso considerar que boa parte desse grupo populacional está em período de transição, saindo da escola e buscando inserção no mercado de trabalho, fase em que enfrenta elevada instabilidade

Cerca de um quarto (27%) dos jovens considerados nem-nem no primeiro trimestre de 2024 não estavam mais nessa situação no trimestre seguinte, a maioria porque começou a trabalhar. Se levado em conta um período maior, 39% dos jovens que estavam sem trabalho e fora da escola no segundo trimestre de 2023 haviam mudado de situação um ano depois

Oportunidades desiguais na saída do ensino médio

Todo ano, aproximadamente dois milhões de jovens concluem o ensino médio. Para muitos, essa etapa marca a entrada definitiva no mercado de trabalho – uns como trabalhadores, outros em busca de trabalho.

Alguns continuam os estudos no nível superior ou se preparam para prestar o vestibular. Dos jovens que estavam no terceiro ano do ensino médio em 2023, cerca de um quarto (23%) não trabalhava ou estudava no ensino regular no início de 2024. As perspectivas de trabalho e estudo dos jovens têm estreita relação com sua origem socioeconômica.

Considerando-se os que terminaram o ensino médio em 2023 e que ficaram sem trabalho e fora da escola no começo de 2024, a maior parte que residia nos lares mais ricos realizava algum tipo de curso. Já entre os moradores de domicílios mais pobres, a situação mais comum era a de busca por trabalho.

Os jovens em domicílios com melhores condições socioeconômicas têm mais chances de continuar estudando após o ensino médio. Enquanto 18% dos egressos do ensino médio em 2023 e de lares mais ricos ingressaram no ensino superior em 2024, apenas 7% dos jovens de domicílios mais pobres seguiram esse caminho.

Entre os que não trabalhavam ou estudavam naquele momento, 9% dos jovens mais ricos estavam empenhados em algum outro tipo de curso. Nos pertencentes aos lares mais pobres, essa proporção era de 6%.

Os jovens que terminavam o ensino médio e pertenciam a famílias de renda menor estavam mais empenhados na busca de emprego do que aqueles de famílias com maiores rendimentos.

Cerca de 40% dos jovens pertencentes a famílias mais pobres que estavam no terceiro ano do ensino médio em 2023 participavam do mercado de trabalho no primeiro trimestre de 2024, sendo que 30% deles estavam trabalhando, enquanto 10% estavam sem trabalho, fora da escola, mas procurando ativamente algum trabalho.

Já entre os jovens de lares mais ricos, os percentuais eram inferiores: 26% e 4%, respectivamente.

Os jovens de lares mais pobres têm menos oportunidades de continuar os estudos. Com isso, são impelidos a entrar no mercado de trabalho. Mas eles também enfrentam problemas nessa empreitada, já que se deparam com dificuldades para conseguir e manter um trabalho.

Nem-nem ou sem-sem?

O problema não são os jovens. Chamá-los de nem-nem traz a falsa sensação de que são eles os responsáveis por uma situação de inatividade que nem mesmo é real, já que a maioria não está parada: está procurando trabalho, dedicando-se a algum tipo de curso não regular ou cuidando dos afazeres domésticos.

Ficar sem trabalho e fora da escola é, em geral, uma situação transitória ou eventuale acontece porque os jovens estão mais propensos a aceitar postos de trabalho precários, sem estabilidade e com alta rotatividade de mão de obra. Eles nem trabalham nem estudam por falta de vagas de trabalho ou oportunidades para a continuação dos estudos.

Muitos não dispõem de recursos financeiros para estudar e até mesmo para procurar trabalho. As oportunidades de estudo e trabalho são desiguais. Aqueles de lares mais pobres chegam ao fim do ensino médio com um leque mais estreito de oportunidadese enfrentam dificuldades na transição escola-trabalho.

Aumentar a oferta de cursos profissionalizantes não é medida suficiente, já que o mercado de trabalho não é capaz de absorver a totalidade da mão de obra qualificada. Tampouco funcionam soluções como as propostas pela reforma trabalhista, que criou modalidades de trabalho com menos direitos e menor estabilidade –como o contrato intermitente e a jornada parcial.

Em vez de resolver o problema, esse tipo de contrato cria vagas de curta duração, o que pode jogar os jovens continuamente à condição de desemprego. O comportamento da taxa de desocupação entre os jovens é idêntico ao do mercado de trabalho em geral, porém em patamares expressivamente superiores, o que revela a falta de oportunidades para esse segmento da população.

Atribuir à juventude a responsabilidade por essa situação é, no mínimo, um equívoco. A solução para esse problema está no crescimento da atividade econômica e na valorização de políticas públicas de emprego e de educação adequadas à realidade dessa população, de modo a lhes assegurar o acesso e permanência na escola e a possibilidade de ingresso em postos de trabalho formais e estáveis.