PAINEIS PINTURAS NA CIDADE
Painel no setor histórico: grafite como manifestação de arte (Franklin de Freitas)

Extrapolando os espaços convencionais reservados para exposições, como os museus, a arte tem extravasado cada vez mais para os cenários urbanos através de intervenções como o grafite, o muralismo, a poesia visual, a pintura, o mosaico e o lambe (colagem). E em Curitiba, essas formas de expressão ganharam recentamente um ambiente mais propício para florescer e dar um colorido especial para a cidade.

É que em outubro do ano passado foi aprovada e sancionada a Lei do Grafite (Lei n.º 16.237/2023), uma iniciativa da professora Josete (PT) e do deputado estadual Goura (PDT, quando ele ainda estava na Câmara Municipal) que tem o intuito de facilitar a autorização do poder público para a realização de intervenções visuais pela cidade. Coincidentemente, a legislação entrou em vigor quase um ano após o polêmico apagamento de uma obra de arte urbana icônica, um painel inspirado no filme “O Iluminado” que ficava no edifício Inter Walter Sprengel (em frente ao Teatro Guaíra) e era conhecido como “Jack Bobão”.

Essencialmente, a intenção da nova lei é reconhecer as intervenções visuais urbanas (o que NÃO inclui a pichação, que segue sendo crime ambiental) como manifestações artísticas de valor cultural, cujo objetivo é democratizar o acesso à arte, revitalizar a paisagem urbana e o patrimônio público ou privado. Com esse reconhecimento, então, veio a criação de regras específicas para o licenciamento dessas obras, um trabalho que compete ao Departamento de Controle do Uso do Solo (UUS), da Secretaria Municipal do Urbanismo (SMU).

Segundo Grazieli Maria Cuman de Castro, engenheira civil do UUS, até o ano passado todas as propostas de intervenções artísticas eram tratadas como publicidade pelo poder público. Com isso, todas as iniciativas artísticas acabavam tendo de ter o aval do Conselho Municipal do Urbanismo (CMU), além do licenciamento do Departamento de Controle do Uso do Solo.

“Se você quisesse fazer na tua casa, tinha de primeiro fazer um recurso pro CMU, que avaliaria se era viável ou não, e com o parecer do CMU abria processo no setor de publicidade e a gente emitia licença. Com essa lei nova, foi criado um trâmite específico para isso, o artista consegue protocolar seu pedido direto pelo site da Prefeitura e, atendendo os critérios, não precisa dessa análise prévia do CMU, faz direto todo o processo no Departamento”, explica a engenheira.

Ainda segundo Castro, desde a aprovação da nova legislação algumas solicitações foram apresentadas, mas apenas uma segue tramitando. É que as outras foram abertas erroneamente – por exemplo, eram intervenções com caráter comercial ou publicitário, sendo consideradas como publicidade e devendo, então, serem aprovadas de acordo com legislação correspondente. Mas mesmo sem nenhum processo finalizado, a expectativa é de redução no tempo de tramitação das propostas verdadeiramente artísticas. “A gente espera que reduza, por conta de não ter essa passagem pelo CMU, o que significa que tem uma etapa a menos. Deve reduzir [o tempo de tramitação]”, aponta.

Pedidos de licenciamento podem ser feitos online. Conheça as regras
Os pedidos de licença para arte urbana podem ser apresentados pela internet, através do Processo Eletrônico de Curitiba (PROCEC), em http://procec.curitiba.pr.gov.br/. A taxa para licenciamento atualmente é de R$ 48,66, valor que deve ser pago uma única vez – ou seja, não existe renovação da licença ou algo do tipo.

“Na proposta, a pessoa tem de apresentar como vai ser a infraestrutura da intervenção, detalhar se vai ter andaime, escada, pra grente garantir a segurança dos transeuntes. Também é importante apresentar uma descrição da obra. Não precisa ser nada elaborado, muito detalhado, mais uma descrição do que será feito mesmo”, comenta Grazieli Castro.

As intervenções podem ser realizadas em muros, paredes, portas e escadas, sendo que no caso de escadas são proibidas intervenções nas superfícies dos pisos ou nos elementos de segurança, tais como corrimãos ou guarda-corpos. Além disso, intervenções em locais privados demandam autorização do proprietário do imóvel (com o artista devendo apresentar a matrícula da propriedade) e da SMU. Para alturas superiores a 10 metros do nível térreo, a intervenção ainda precisa do aval do Conselho Municipal do Urbanismo (CMU). No caso de imóveis tombados ou inventariados, a decisão cabe à Câmara Técnica do Patrimônio Cultural Edificado e Paisagem Urbana (CAPC).

Centro da Capital é “campo fértil” para a arte urbana
Desde antes da aprovação da Lei do Grafite, Curitiba já havia se tornado um espaço rico em arte urbana. E o Bem Paraná, então, montou um breve roteiro, com algumas das obras espalhadas pelo Centro da cidade.

Na esquina das ruas Marechal Deodoro e Conselheiro Laurindo, por exemplo, o Edifício Muralha traz a imagem do lendário Ray Charles sorrindo, numa obra de Leandro Lesak a.k.a cínico. A poucos metros dali, no centro gastronômico Alameda Curitiba, fica o painel “Mucha Tinta”, de quase 300 metros quadrados, assinado pelos artistas goianos do Bicicleta Sem Freio.

Subindo para as proximidades da Praça Santos Andrade, temos próximos da Estação Central um painel de Fernando Gardpam que homenageia o escritor Paulo Leminski. É o mesmo artista que também realizou no ano passado uma outra obra, na Praça Generoso Marques, homenageando a poetisa Helena Kolody.

Na Galeria Julio Moreira, sob a Travessa Nestor Castro, há outro desenho, de autoria dos artistas João Marcos e Michael Devis, que homenageia Paulo Leminski. E na Praça do Ciclista, as artistas Carol Lemes, Lu Gnoatti e Marcella Calado fizeram há alguns anos um painel de mais de 16 metros que se somou a uma obra já existente de Cris Pagnancelli e Txay para incentivar o uso da bicicleta como meio de locomoção.

E na Biblioteca Pública do Paraná (BPP), há ainda um painel de 12 metros de altura por 10 metros de largura pintado por Celistino Dimas que retrata uma cena do filme “O que é que há, Gatinha?” (1965), em que o cineasta Woody Allen beija a atriz Romy Schneider dentro de uma biblioteca. Na cena retratada, os dois se equilibram em escadas em frente a livros enquanto se beijam.