O ornitólogo Alberto Urben Filho, autor do livro “Aves de Curitiba”: “Pessoas não tem noção da biodiversidade” (Valquir Aureliano)
Valquir Aureliano

Talvez a maioria dos curitibanos nem saiba ou não repare, mas o céu da capital paranaense possui um colorido mais intenso e variado do que outros lugares. É que diferentemente do que muitos imaginam, o ambiente urbano também pode abrigar variadas espécies de aves. E em Curitiba, cidade conhecida como a capital ecológica, mais de 300 espécies de aves já foram identificadas cantando por aí, colorindo e alegrando o céu da cidade.

O WikiAves, por exemplo, é uma plataforma interativa direcionada à comunidade brasileira de observadores de aves. E conforme os registros que constam nesse site, 336 espécies de aves já foram avistadas na cidade, com registros em foto ou som. A riqueza local, no entanto, pode ser ainda maior. Conforme o livro Aves de Curitiba, cuja segunda edição foi publicada no final de 2014 a partir do trabalho de 18 ornitólogos, desde o século XIX um total de 389 espécies nativas já foram identificadas na cidade, além de sete espécies introduzidas e já aclimatas e outras 24 exóticas de ocorrência acidental ou que ainda não haviam se estabelecido.

Segundo o ornitólogo Alberto Urben Filho, um dos autores do livro, muitas pessoas não têm noção da biodiversidade que existe em Curitiba. “Só para você se assustar, o município de Curitiba tem a mesma quantidade de espécies de aves que toda a Europa. Isso só Curitiba. Já o Estado do Paraná [que tem mais de 700 espécies registradas] possui a mesma quantidade de aves da América do Norte”, afirma o especialista.

Mas o que explicaria essa riqueza e variedade da avifauna curitibana, especialmente quando consideramos que essas aves vivem num espaço urbano e em volta de muita poluição? O que acontece é que Curitiba possui um cinturão verde, uma linha que concentra fragmentos florestais inseridos em regiões com parques como o Tanguá, o barigui e o Passaúna.

“É uma faixa que atravessa um terço da cidade. Dois terços do território é bem degrado, mas essa faixa é bem conservada. E Curitiba é uma cidade bem arborizada, também. Nesse fragmento florestal perto da minha casa [no Mossunguê], por exemplo, tem dois gaviões enormes, um gavião-pato e outro gavião-pega-macaco”, explica o especialista. “A gente chama isso de matriz ecológica. O que vai definir essa riqueza, abundância de aves é a matriz ecológica, ou seja, a presença de fragmentos verdes”, complementa.

Entre os pássaros já estabelecidos na Capital, alguns são considerados bastante comuns e fáceis de se encontrar, como o quero-quero. Outros exemplos são o joão-de-barro, que costuma chamar a atenção pelos ninhos de barro, o sabiá e seu canto característico, canarinhos, beija-flor, bem-te-vi, tucano de bico verde, periquito verde e três espécies de pombas — avoante, zenaida e branca.

Um hobby barato e que conquista cada vez mais adeptos

Para começar a fazer a observação de aves, basta ter vontade, essencialmente. Isso porque a observação pode ser feita em qualquer lugar com aves, não raro a olho nu ou até mesmo só ouvindo o canto do pássaro. O investimento necessário também não é elevado, já que um bom binóculos para aqueles que querem otimizar a experiência contemplativa pode ser adquirido por menos de R$ 1 mil.

“É um hobby saudável e barato, porque ave tem em todo o lugar. Se você vai no Passaúna, por exemplo, lá está sempre cheio de ave. Ou seja, qual vai ser o teu gasto? Comprar um bom binóculo, que custa menos de R$ 1 mil, e depois você vai ter algum gasto comprando guias. Mas hoje tem ferramentas de pesquisa online também, como aplicativos que identificam a ave pelo som ou por uma foto”, cita Alberto.

Todo o investimento feito, por outro lado, se converte em benefícios diversos para o observador. “[O hobby] Aumenta a acuidade visual e auditiva. Se você pegar nomes científicos [das aves], todos são em latim, e latim é a base da língua portuguesa, então você melhora o seu vocabulário. Você melhora também o conhecimento geográfico. ‘Ah, tal espécie ocorre só na Chapada do Araripe’. Tá, mas onde fica o Araripe? Daí você vai procurar, descobre que é no Ceará… Então a observação de aves faz você melhorar diversos conhecimentos”, destaca o ornitólogo, ressaltando que o hobby tem conquistado cada vez mais gente. “É uma coisa que está explodindo, a procura tem crescido.”

RÁPIDA:
Natureza dinâmica

O livro “Aves de Curitiba”, que identificou a existência de 396 espécies (nativas ou introduzidas) de aves na capital paranaense, é um trabalho que levanta informações sobre a observação de aves na região desde o século passado, inclusive buscando informações e registros de aves de Curitiba em museus de história natural da Europa. A natureza, entretanto, é dinâmica, ressalta Alberto Urben Filho. Isso significa que muitas dessas espécies talvez já não possam mais ser observadas na cidade, enquanto outras tantas foram sendo introduzidas ao longo do tempo. “Por exemplo, na década de 1990 quando eu comecei a estudar Biologia, não existia muito jacu em Curitiba, só no Barigui que tinha uma família. Hoje, aqui na frente de casa, eu vejo uns 15, 20 jacus por dia”, exemplifica o especialista. “As aves que tinham no início do século eram completamente diferentes das aves que existem agora.”

SAIBA
Onde observar pássaros na Grande Curitiba

Alberto Urben Filho destaca ainda que Curitiba é um lugar maravilhoso para se fazer a observação de aves. Os parques pela cidade (como o Barigui, o Passaúna, o Tingui e o Tanguá), por exemplo, são boas pedidas para quem quer se iniciar na observação. “É um hobby saudável, que você pode praticar a qualquer momento”, explica o ornitólogo, recomendando ainda que os iniciantes procurem cursos para começar a adentrar nesse mundo e conteúdos online, como o canal de YouTube “Planeta Aves”, do biólogo Willian Menq.

Outros locais na capital paranaense são a região do Zoológico e do Parque Náutico do Iguaçu (no Boqueirão), o Passeio Público e o Bosque do Papa. Também há locais não muito distantes da capital, por onde há,inclusive, gralhas-azuis; a Estrada da Graciosa, que permite a visualização de aves do planalto e de pássaros da Mata Atlântica; além da Serra de São Luiz do Purunã, no caminho para Ponta Grossa.