JOSEPHE FRIEDECHI HERB JOE DJ
O DJ Herb Joe: amor pela música brasileira e pala música paranaense numa coleção invejável de vinis (Foto: Franklin de Freitas)

Pare e pense por um instante: quantas bandas, cantores ou compositores de Curitiba ou do Paraná você conhece? O que você sabe sobre a música paranaense?

Para quem é do meio do rock, uma resposta fácil é a banda Blindagem. Para os mais atentos aos hits dos últimos tempos, grupos como Jovem Dionísio (conhecido pela canção “Acorda Pedrinho”) e A Banda Mais Bonita da Cidade (que estourou com “Oração”) podem ser respostas mais óbvias. Mas a música paranaense esconde verdadeiros tesouros que foram lançados – e não raro esquecidos pelo grande público – ao longo das últimas décadas. E um curitibano tem se dedicado a redescobrir essas pérolas.

Aos 28 anos de idade, Josephe Friedrich Trevisan Souza é um verdadeiro amante da música. Uma relação que começou como uma paixão e logo se tornou vocação, com ele começando a colecionar discos de vinil, a discotecar (quando assumiu a identidade do DJ Herb Joe, que hoje pode ser encontrado na noite curitibana tocando em lugares como a Honey Vox, o Barleria e o Ruína Bar) e a também vender LPs e compactos (é o fundador e proprietário da Herbsman Records e um dos maiores garimpeiros de vinis).

Eu comecei a consumir discos em 2011, 2012. Eu colava nas festas de reggae com 15, 16 anos, curtia também um punk rock, e aí nas festas sempre olhava os disquinhos girando e achava muito legal esse mundo, porque tinha coisa que a gente só escutava no vinil, né? Escutava a música numa festa, depois procurava porque queria escutar de novo e não achava em lugar nenhum. Tinha que ir na festa pra escutar de novo aquela pedrada”, recorda Herb Joe.

A partir desse fascínio pelos discos que eram tocados em festas ele começou a fazer sua própria coleção, após ganhar um toca-disco de um amigo. Inicialmente o foco era justamente o punk rock e o reggae, os gêneros que ele mais curtia ouvir. Mas logo sua paixão musical começou a transbordar para outros estilos e ele acabou se apaixonando também pela música brasileira, de maneira geral.

“Comecei a estudar bastante, tanto que no começo não gostava muito, não era muito a minha vibe a música brasileira. Mas depois eu comecei a curtir demais”, relata o DJ, que hoje tem em sua coleção milhares de discos – tantos vinis que é até difícil contar o número exato.

“Devo ter uns 6 mil discos, sendo uns 5 mil só de música brasileira. E isso só em LP, porque devo ter mais de mil compactos de reggae também, que gosto muito e coleciono, e também tenho bastante funk soul, jazz, black music… Você vai começando a se ligar, né?!”, emenda ele.

Foi na esteira desse gosto pela música brasileira, inclusive, que começou a também surgir o amor pela música paranaense e curitibana.

“A galera só tem se ligado em música de fora. Mas aí eu comecei a ver como era legal a música brasileira e, a partir disso, comecei a me ligar também na música daqui de Curitiba, na música paranaense. São coisas que, querendo ou não, acabaram perdidas com o tempo e hoje em dia boa parte da galera nem conhece música daqui, ficam sempre no superficial. Eu já gosto de ir atrás, procurar selos que gravavam artistas daqui, músicos que gravaram só uma ou duas músicas, uns artistas bem independentes, mais obscuros, né?

JOSEPHE FRIEDECHI HERB JOE DJ
Paixão por reggae e do punk rock acabou virando paixão pela música: “Cada disco é uma faculdade” (Foto: Franklin de Freitas)

DJ e oráculo dos bolachões: o comércio de discos explode

Foi no final de 2015, cerca de quatro anos depois de adentrar o universo do vinil, que Josephe começou a discotecar, incentivado por amigos. Inicialmente seu foco era tocar reggae, mas com o tempo (e o crescimento de sua paixão) a música brasileira começou a ganhar mais espaço e suas apresentações, nos seus sets.

“É uma escola, né? Eu falo que cada disco é uma faculdade: a gente vai aprendendo, transitando por várias épocas e vários lugares. E a pesquisa da música aqui de Curitiba é muito legal também, porque sempre encontramos algo que acaba surpreendendo a gente. Sempre tem uma obscuridade, uma música ‘antiga-nova’ pra gente descobrir e divulgar”, afirma o DJ.

Até pouco tempo, no entanto, Herb Joe era bem apegado aos seus discos. Uma situação que começou a mudar anos atrás, após o término de uma relação e a chegava da pandemia, que acabou o fazendo ficar sem renda já que não podia mais discotecar. Foi quando ele resolveu começar a focar na compra e venda de discos de vinis, criando um grupo de WhatsApp focado na venda de elepês junto com outro colega DJ, o Paulo Henrique da Vinil Attack. Uma aposta que acabou dando muito, mas muito certo.

“Na pandemia, acabou a grana, acabou tudo. Não tinha mais como discotecar. E aí eu decidi focar em vender disco e passei a pandemia inteira vendendo disco. E vendi disco pra caramba, porque a galera tava mais em casa e muita gente decidiu voltar a ouvir música no vinil. Aí a coisa explodiu e o preço dos discos mais que dobraram. Discos que eram vendidos por R$ 10, R$ 15, hoje em dia você encontra por uns R$ 50”, conta ele.

As maiores pedradas da música paranaenses que precisam ser (re)descobertas

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DJ
Josephe Friedrich, o DJ Herb Joe, com as “pedradas desconhecidas” da música paranaense (Foto: Franklin de Freitas)

A pedido do Bem Paraná, o DJ Herb Joe preparou uma lista com algumas pedradas menos conhecidas da música paranaense e que qualquer amante de boas canções deveria dedicar um tempo para escutar e conhecer. Abaixo, você confere a sugestões do nosso oráculo musical:

Disco “SamJazz” (1979)

O quinteto SamJazz foi uma banda curitibana que fez sucesso na década de 1970 ao variar em seu repertório interpretações de clássicos nacionais, internacionais e composições próprias utilizando um belíssimo arranjo de jazz. O disco sugerido por HerbJoe foi gravado em Curitiba, sendo produzido pela SIR – Laboratório de Som e Imagem e lançado em dezembro de 1979.

“Eu fiquei abismado quando conheci SamJazz. Descobri uma vez que fui pra Sâo Paulo e um DJ de lá estava tocando essa música. Eu estava vidrado em samba rock e perguntei pro cara que pedrada era aquela e ele contou que era de uma banda de Curitiba, SamJazz. Consegui na época, pelo garimpo, achar três exemplares desse disco, pelos quais paguei entre R$ 5 e R$ 10. Hoje em dia é um disco muito raro, que se encontra por uns R$ 500”, conta Josephe.

O grande destaque do álbum, comenta ainda o DJ, é a música chamada Nega Neguinha, escrita por Antônio Eugênio Ferraz (natural de Antonina, no litoral do Paraná) e que foi campeã de um dos Festival de Música de Paranaguá na década de 1970. “Essa música é uma pedrada do samba rock, uma parada absurda. Você escuta e fala ‘nossa, isso é do Rio de Janeiro, né?’ E não, é uma parada feita em Curitiba nos anos 1970, foda pra caramba”, comenta o especialista.

Trilha sonora de “Deu a Louca em Vila Velha” (1980)

Outro disco não tão conhecido pelo grande público e destacado por Herb Joe é a trilha sonora do filme ‘Deu a Louca em Vila Velha’. Foi uma produção da Ponzio, que era também uma loja de discos e que chegou a gravar dois filmes (‘Caminhos Contrários’, além do já citado) por iniciativa de Arlindo Ponzio, diretor e roteirista das duas obras. Hoje, já é difícil achar a trilha sonora (que teve participação de Luís Fernando Amaral e Victor Bass) e mais difícil ainda de achar os filmes para assistir.

“Uma música especial no ‘Deu a Louca em Vila Velha’ é a ‘Cavalos de Ferro’, que é um funk soul único. Já o outro filme da Ponzio, ‘Caminhos Contrários’, tem a música ‘Grilos na Pista’ e ‘Os Agentes’. Hoje, você só acha praticamente lá fora esses discos. Foram feitas poucas cópias na época e a maioria acabou indo pra fora, o que tornou muito difícil de achar. O compacto de ‘Caminhos Contrários’ é o mais raro, eu só vi um exemplar até hoje”, relata o DJ.

Disco “As Nymphas Em Cantos” (1982)

O Grupo Nymphas é um grupo vocal que nasceu em 1978 em Curitiba e foi composto por jovens curitibanas. Lançaram cinco álbuns e um EP, sendo que o primeiro álbum, “As Nymphas Em Cantos”, foi publicado em 1982.

“É um grupo formado só por cantoras daqui de Curitiba e é uma parada fina, com uma produção independente daqui. Eu destaco o primeiro disco delas, de 1982, que tem músicas muito bonitas, como a que fala da Ilha do Mel, Giramundo… Lindo demais, fino, muito bonito”, exalta Herb Joe.

Álbum “A Música dos Alunos da Positivo – Música Viva 83”

Outro disco destacado pelo DJ é o “Música Viva 83”, um disco curiosamente gravado por alunos do Colégio Positivo e que traz diversos tipos de canções. “Foi um amigo meu, Lucas Nonose, DJ da Disco Veneno, que me apresentou esse aqui. É um disco pro qual a galera não dá muita bola, mas você vai escutar os arranjos dele e são coisas de outro universo”, destaca Herb Joe.

Entre as músicas destacadas pelo especialista estão “Madrugada” e “Lúmen”. E os arranjos, garante Herb Joe, são primorosos. “A galera gosta muito do Arthur Verucai hoje em dia, que é um maestro. E eu digo que os arranjos desse disco aqui não perdem em nada pros arranjos do Arthur Verucai.”

Disco “O Som do Samba no Sul” (1980)

O “Som no Samba do Sul” é mais um trabalho de um músico curitibano, Dirceu Graeser. “Tem uma pedrada daqui que eu gosto muito, chamada ‘Dizem’, samba rock daqui de Curitiba. Escutem que vocês vão gostar demais”, indica Herb Joe.

Álbum “Todas as pessoas” (1987)

Recentemente, Herb Joe conta que comprou um disco chamado “Todas as Pessoas”, que apresenta uma borda destacada, bem diferente do que se vê em qualquer outro disco de vinil. Trata-se de uma obra lançada por um artista que hoje tem uma barraca na Feira de domingo no Largo da Ordem, o genial José Oliva, dono da Caixinhas de Atitude.

“Ele gravou esse disco aqui em Curitiba e parece que na época não deram muita bola para ele, mas hoje em dia é um disco cultuado pra caramba, lá fora a galera procura demais esse disco. As músicas são incríveis, a composição… E o disco se chama ‘Todas as pessoas’ e ele chamou todos os amigos que ele tinha, tem a participação dos filhos dele, todos os amigos dele… É um álbum espetacular aqui de Curitiba, pouco conhecido, mas que também que vale muito a pena conferir”, ressalta.