Tomizawa: “As pessoas redescobriram o prazer de escutar” (Valquir Aureliano)

Eles chegaram a ser coisa do passado. Ou melhor, chegaram a parecer ter virado coisa do passado. Mas agora os LPs e os CDs estão de volta e com uma nova áurea, cool e cult, que tem (re)conquistado um número cada vez maior de consumidores de diferentes idades em Curitiba, movimentando a indústria fonográfica como um todo.

Muito comum nos lares brasileiros até meados dos anos 1990, os discos de vinil (também conhecidos como LPs, sigla para Long Play Music) foram por muito tempo a principal forma de se consumir música em mídias físicas no mundo todo. Uma tradição, no entanto, que começou a se perder a partir justamente do surgimento dos CDs (Compact Disc), que, por sua vez, chegaram ao ocaso com o alastramento do MP3 (MPEG Layer 3) e, mais recentemente, com o surgimento dos serviços de streaming.

Por algum tempo, as duas mídias físicas pareceram ter se tornado obsoletas com o avanço da música digital. LPs, por exemplo, chegaram a deixar de ser prensados por muito tempo no Brasil, país que chegou a ser, em 1994, o maior consumidor de vinis no planeta, e muitos artistas (especialmente entre o final dos anos 1990 e início dos anos 2000) deixaram de publicar seus trabalhos em vinil.

Em 2012, contudo, a produção nacional foi retomada e o antigo bolachão voltou a aparecer nas prateleiras de lojas, num primeiro sinal de que uma nova vida surgia para os vinis. Um movimento que ganhou ainda mais força recentemente, quando a pandemia do novo coronavírus obrigou o isolamento social e fez muitas pessoas descobrirem ou redescobrirem o prazer não só de ouvir música em LP, mas também de ter uma experiência tátil (devido à forma de se pegar num vinil, como se colocam as faixas) e visual (com encartes que são verdeiras obras de arte, as fichas técnicas com informações sobre a banda, produção, etc).

“Consumo na pandemia aumentou muito. Muitas pessoas mantiveram poder aquisitivo intacto, estavam em home office, não tinha show, viagem, restaurante, e aí as pessoas focaram no prazer de escutar um disco, comprar até um toca-disco”, relata Horácio Tomizawa De Bonis, proprietário da Sonic Discos, citando ainda alguns motivos que explicam o novo sucesso dos LPs. “Primeiro, é o o próprio interesse das gravadoras, que estão vendendo tudo de novo o que já venderam. E o LP é atrativo pela qualidade de som, pela capa, por uma série de coisas. E as pessoas começaram a se tocar do que nós, colecionadores de LPs, pessoas que nunca deixaram o LP, já sabíamos. As pessoas viram que é bacana”, diz.

Já Ronald Gel, da Confraria do Vinil, vai ainda mais longe. Segundo ele, existe um colecionismo do vinil de antes e outro de depois da pandemia. “Antes da pandemia, não davam o devido valor. Mas na pandemia a música foi uma porta de saída para não enlouquecer, ajudou as pessoas a buscarem paz e tranquilidade. E graças a isso o pessoal começou a resgatar a memória afetiva com o disco de vinil”, diz.

“Na pandemia e no pós-pandemia o pessoal começou a resgatar isso, se dedicando a ouvir um disco de vinil, olhar, contemplar, ver a capa como é feita, quem está na banda, na produção…”, afirma.

Mercado de Compact Disc se aproveita do embalo dos bolachões

Com o retorno dos vinis à cena musical, outra mídia tem começado a reconquistar espaço no mercado. São os CDs, que se tornaram uma espécie de alternativa para alguns consumidores. “O mercado de CD reaqueceu justamente por causa do vinil. Se a pessoa vai atrás de um disco e não consegue achar ou o disco que ela busca é muito caro, ela acaba recorrendo ao CD”, aponta Ronald Gel, apostando ainda que o vinil não vai ficar para trás do CD entre os colecionadores e fãs de música, como acontece lá atrás. “Pessoal recorre hoje ao CD porque não consegue o vinil. Temos um hiato muito considerável na indústria, onde grandes bandas, principalmente o pessoal do New Metal, todos os registros que temos até hoje são em CDs”, explica ainda ele, que comercializa em sua loja tanto LPs como CDs.

Horácio Tomizawa De Bonis, por outro lado, já está se preparando para começar a vender também CDs usados na Sonic Discos. Segundo ele, uma boa alternativa porque o preço caiu muito em relação ao vinil importado, por exemplo. “Eu tenho muita coisa em CD que não foi lançada em vinil e muita coisa em vinil que não foi lançada em CD, então eu mantenho as duas mídias como colecionador”, comenta o empresário, destacando que o mais importante, no fim das contas, sempre é a música. “A música vem em primeiro lugar. Se o cara está feliz ou o cara não tem condições de comprar LP ou CD, está okay, que ouça em MP3, porque o que importa é o prazer da música.”

Uma trajetória musical retrata a indústria fonográfica


A trajetória de Horácio Tomizawa De Bonis, curiosamente, de certa forma retrata toda essa história da indústria fonográfica. Paulistano e desde 1991 em Curitiba, ele abriu ainda no início dos anos 1990 uma loja de discos na capital paranaense, a 801 Discos, que funcionou entre 1991 e 1999. Inicialmente, o estabelecimento trabalhava principalmente com LPs, mas na medida em que os CDs foram ganhando mais mercado, a loja foi se adaptando. “Depois, minha loja se transformou numa loja de CDs, mas nunca deixou de ter vinil, usados e novos”, conta ele, relatando que em 1999 fechou o estabelecimento por conta do início da era das Mega Stores de música na cidade.

Enquanto a mídia digital avançava, Horácio seguiu trabalhando vendendo alguns LPs e CDs para clientes fiéis, muitos dos quais acabaram se tornando seus amigos. “Fazia em casa mesmo, home office já existia para mim de 1999 a 2015”, brinca ele, que em 2015 decidiu voltar a ter uma loja física, inaugurando a Sonic Discos, que recentemente celebrou seu sétimo aniversário. “1º de agosto fez sete anos da loja, mas neste espaço estamos há cinco meses. A loja anterior tinha um quarto do tamanho da loja atual e estamos com uma coisa bem diversificada, com discos de R$ 35 a R$ 350. Tem um pouco de tudo”, relata.

A Sonic Discos fica na Rua Comendador Araújo, 143, loja 15, no Executive Center Everest. O telefone (e WhatsApp) para contato é o (41) 3324-2546 e também é possível acompanhar o trabalho da empresa pelas redes sociais: o Instagram é @sonic_discos.


Curitiba tem a maior feira do Sul do Brasil; evento acontece neste final de semana


Amanhã vai rolar a 16ª Feira Nacional Curitiba Vinil, a maior feira de discos de vinil do sul do país. O evento, que é gratuito, acontece na galeria A Travessa David Olympio Carneiro, no centro de Curitiba (R. Treze de Maio, 439), das 9 às 18 horas, e reunirá mais de 30 expositores de vários estados com discos nacionais, importados, lacrados ou prensagens originais de época. As fitas assete e os CD’s também marcarão presença, assim como camisetas temáticas do universo da música e cultura em geral.

Um dos organizadores do evento, Ronald Gel conta que a feira tem crescido exponencialmente desde sua criação, há sete anos. Em suas primeiras edições, a Curitiba Vinil reuniu entre 100 e 200 pessoas. Hoje, o evento tem um giro de 1 mil a 1,5 mil pessoas. “Foi exponencial o aumento da procura, agora é 10 vezes mais gente do que lá atrás”, afirma Ronald, comentando ainda que a expectativa é boa para o final de semana. “Setembro e dezembro são as melhores datas, pessoal com mais poder aquisitivo, dinheiro extra para gastar com colecionismo. Esperamos movimento muito bom na feira.”

Para saber mais, acesse o Instagram @curitibavinil. Também é possível comprar discos e CDs pelo site da Curitiba Vinil.