Frankin de Freitas

O ano de 2021 está se despedindo e o olhar para o futuro traz à tona questionamentos diversos, muitos dos quais podem ser resumidos numa única pergunta: afinal, o que podemos esperar de 2022? Para responder à interrogação e apresentar algumas perspectivas, o Bem Paraná ouviu nos últimos dias especialistas de diferentes áreas para entender um pouco sobre o que o ano novo nos reserva. Em resumo, há motivos para otimismo no campo sanitário (apesar da pressão que novas variantes do coronavírus podem vir a causar no sistema de saúde), a previsão de mudanças na seara política (especialmente por conta das eleições) e, mais uma vez muitas dificuldades na área econômica, com a população convivendo com inflação e desemprego em patamares elevados. 

Começando pela saúde pública, Marcelo Ducroquet, que é infectologista e professor do curso de Medicina da Universidade Positivo (UP), destaca que 2021 foi o ano da vacina, até o momento a medida mais eficaz no combate à pandemia. Outro ponto importante, comenta ainda ele, foi o reconhecimento de novas variantes, que podem ter comportamentos diferentes do vírus ‘original’ e até mesmo afetar a eficácia da vacina. Já para o próximo ano, até tendo em vista o que já acontece no exterior, a previsão é que voltemos a ter momentos de maior pressão sob o sistema de saúde, mas com a Covid já trilhando um caminho para se tornar uma doença endêmica.

“Olhando para o hemisfério norte, americanos e europeus enfrentam uma nova onda [da pandemia], provavelmente relacionada â variante ômicron, e o mundo está vivendo o pico do número de casos, com mais de 1 milhão de casos diários – no auge anterior, em abril, eram 850 mil casos por dia. O número de mortes não acompanhou esse pico, mas tendo uma incidência tão alta, uma ascensão tão rápida, alguma pressão no sistema de saúde vai existir’, afirma Ducroquet, complementando, ainda, que tudo isso pode representar um primeiro passo para a Covid se tornar uma doença com a qual passaremos a conviver normalmente, como já aconteceu, por exemplo, com o H1N1. “Com cada vez mais gente imune e casos menos graves, o coronavírus vai se tornando um vírus de circulação habitual. Esse é um comportamento natural. Um vírus bem-sucedido viaja junto com seu hospedeiro, não mata esse hospedeiro.”

No campo político, é inevitável comentar sobre eleição para falar sobre 2022. Ainda mais quando temos, como comenta Eduardo Faria Silva, constitucionalista e professor do curso de mestrado em Direito da UP, um cenário de campanha antecipada – mesmo que do ponto de vista legal isso não tenha acontecido. E a previsão, como as pesquisas eleitorais indicam até o momento, é de uma disputa polarizada entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o atual presidente Jair Messias Bolsonaro (PL). Uma disputa polarizada, contudo, que não deve ser interpretada como refletindo, necessariamente, em mais polarização política no país.

“Tudo indica, todas as pesquisas e levantamentos, que teremos o protagonismo do atual presidente [Bolsonaro] e do ex-presidente Lula, são as principais figuras que entram em 2022 na disputa. Dependendo de como se conclui o cenário de 2021, como o governo federal se posiciona em 2022 na política econômica, ambiental e sanitária, podemos ter uma eleição de dois turnos. Se as respostas não forem adequadas, há possibilidade de eleição num único turno. Improvável que tenhámos outros dois atores para além de Bolsonaro e Lula”, afirma Eduardo, explicando que a ideia de polarização política pode ir se desfazendo dependendo da forma como a eleição se encaminhar.

“Se tivermos uma eleição que se encaminhe pro primeiro turno, com Lula a frente com porcentual significativo, a ideia de polarização pode ir se desfazendo, é uma questão matemática. Se tiver segundo turno, isso também pode acontecer dependendo das composições, dos apoios e das diferença de votos entre os dois candidatos [Lula e Bolsonaro”, diz o constitucionalista, reforçando ainda que as eleições de 2022 são diferentes das que tivemos em 2014 e em 2018. “Em 2018 dava para olhar pro retrovisor de 2014, mas 2022 não dá. É um cenário distinto por tudo que vivenciamos nos últimos anos no país”.

 

Cenário nebuloso e um tanto pessimista para a economia

Finalmente, no âmbito econômico, o ano de 2021 foi marcado pela retomada da atividade em maior escala, especialmente no setor de serviços e a partir do segundo semestre, quando a vacinação contra a Covid-19 acelerou e a cobertura vacinal foi crescendo. Apesar disso, o nível de desemprego ainda é elevado e os níveis de consumo não retornaram aos patamares pandêmicos. Para que isso acontecesse, então, o país deveria seguir nesse caminho de retomada, mas aí há uma série de ‘pedras no caminho’, como explica a economista Leide Albergoni, professora da UP.

“Uma dessas pedras no caminho é o desemprego elevado, e com o desemprego alto, o salário tende a baixar, porque tem muita gente qualificada no mercado e as empresas contratam por um salário menor. O trabalhador então perde poder de compra e, para ajudar, ainda temos a inflação elevada, o que resulta em mais perda do poder de compra”, cita a especialista.

Em 2021, a previsão é que a inflação feche o ano próximo de 10%. E para combater a inflação, o ‘remédio’ que o governo deve utilizar é aumentar a taxa de juros básica na economia, o que impacta na taxa de juros do crédito para o consumidor. “O crédito é como se fosse o oxigênio no nosso corpo. Ele faz o sangue circular, faz o dinheiro circular na economia. Com o oxigênio tendo mais dificuldade para entrar, temos dificuldade para aumentar a circulação de sangue no organismo, digamos assim, o que resulta numa recuperação muito mais lenta da economia.”

Com relação ao preço dos alimentos, cuja alta chegou a assustar em 2021, as notícias também não são positivas. “Temos muitos desafios para 2022, um dos principais deles é a questão da energia elétrica, crise hídrica, que não tem previsão de melhora. Isso continua pressionando os gastos do consumidor. Combustível também tem previsão de aumento e os alimentos, de modo geral, dependem do fato clima, das condições climáticas. Se continuar a crise hídrica, tende a encarecer o preço dos alimentos”.

 

FRASES DOS ESPECIALISTAS

 

“Com cada vez mais gente imune e casos menos graves, o coronavírus deve se tornar um vírus de circulação habitual, a Covid deve virar uma doença endêmica. Esse é um comportamento natural. Um vírus bem-sucedido viaja junto com seu hospedeiro, não mata seu hospedeiro. O ebola, por exemplo, tem dificuldade de se espalhar fora da região onde tem seu hospedeiro animal. Quanto menos sintomático, mais chance de adequação. Isso é esperado. O H1N1 também, 2009 foi traumático, tivemos óbitos, paramos por duas semanas as aulas. Agora ele está por aí ainda, mas convivemos com ele, não nos surpreendemos mais. A perspectiva é que aconteça a mesma coisa com o Covid no prazo de alguns meses, um ano ou dois anos.”

Marcelo Ducroquet, infectologista e professor do curso de Medicina da Universidade Positivo (UP)

 

“Todos os cenários apontam Lula e Bolsonaro num eventual segundo turno. Os demais candidatos, até o presente momento, não indicam ter capacidade de reverter esse quadro. Mas as eleições de 2022 são diferentes das de 2014 e 2018 e precisamos ter isso muito claro. Em 2018 dava para olhar pro retrovisor de 2014, mas em 2022 não dá. É um cenário distinto por tudo que vivenciamos nos últimos anos no país. No cenário internacional, inclusive na América Latina, vemos o fortalecimento de um viés de centro e centro-esquerda, o que também influencia no cenário local. E na Europa temos alteração de posicionamento de alguns países, que são elementos importantes para a gente considerar para este próximo período”

Eduardo Faria Silva, constitucionalista e professor do curso de mestrado em Direito da UP

 

Economista em geral é bem pessimista e o cenário é bastante complicado, realmente. Não tem ainda muita expectativa de cenário positivo. Talvez as únicas coisas positivas são que a previsão pra taxa de câmbio é se manter no mesmo patamar e que devemos ter a inflação desacelerando um pouco. Quando vamos somando os fatores vemos que o cenário é terrível e temos ainda uma grande incerteza política, tanto pelo cenário eleitoral como também pelas promessas de campanha que o governo fez e não está executando, o que gera desconfiança do setor financeiro. Está se Achando formas de driblar o teto de gastos, de descumprir compromissos e até alterar a legislação para descumprir esse compromisso, que foi bastante positivo num momento de recuperação.”

Leide Albergoni, professora do curso de Economia da UP