‘Coringa 2’ é um musical. Ou não. Mas é um delírio

Filme estreia amanhã e traz números musicais em meio a um clima denso e tenso

Lycio Vellozo Ribas
Coringa – Joker principal

Harleen Quinzel (Lady Gaga) e Arthur Fleck, o Coringa (Joaquin Phoenix): fantasia e tensão (Fotos: Divulgação)

A origem do Coringa, o famoso vilão do Batman, gea controvérsias até mesmo nos quadrinhos. A versão mais aceita é a retratada em ‘A Piada Mortal’, no qual ele era um comediante fracassado que, ao tentar um assalto com uma quadrilha, acaba surpreendido pelo Batman, cai dentro de um tanque de ácido e fica irremediavelmente louco. No cinema, o filme ‘Coringa’, de 2019, consegue revelar e ao mesmo tempo sonegar a origem do vilão. O diretor Todd Philips entregou um filme totalmente diferente da estética de filmes de quadrinhos. Denso e tenso. Como o sucesso foi estrondoso e rendeu uma penca de Oscars – inclusive para Joaquin Phoenix no papel do palhaço criminoso –, era de se esperar uma continuação. Passados cinco anos, ‘Coringa: Delírio a Dois’ estreia nos cinemas amanhã.

Desde sua produção, havia rumores que o novo filme do Coringa seria um musical. Rumores que ganharam força quando a cantora Lady Gaga ficou com o papel de Harleen Quinzel, a psicóloga psicopata que é gamadona no Coringa. Seria um desperdício não usar sua potente voz no filme. Bom, ‘Coringa: Delírio a Dois’ é um musical. Ao mesmo tempo, não é. Entre o clima tenso que permeia todo o longa, alguns números musicais entoados pelo casal servem para fomentar o delírio a dois. Um exercício de fantasia em meio à tensão. Exemplo: quando os demais presos do Asilo Arkham ficam sabendo que a perspectiva de Arthur Fleck (o Coringa) é a pena de morte, ele mesmo sai cantando “Pela primeira vez na minha vida, tenho alguém que precisa de mim”, verso de ‘For Once um My Life’, eternizada por Frank Sinatra.

Em termos de trama, ‘Coringa: Delírio a Dois’ passa-se dois anos depois dos acontecimentos do primeiro filme. Arthur Fleck está preso, devido aos crimes cometidos no filme anterior, e aguarda julgamento. Dentro do Arkham, ele conhece Harleen Quinzel, ou Lee para os íntimos – que é o que eles vão se tornar. Enquanto o ambiente de prisão tenta sufocar o Coringa que habita em Fleck, Lee tenta fazer aflorar o Coringa e, por tabela, sufocar o Fleck que existe dentro dele.

Ao contrário do primeiro filme, cuja história envolve a vida particular de Thomas Wayne (pai de Bruce Wayne, o Batman) e seu assassinato (esse spoiler prescreveu), ‘Coringa. Delírio a Dois’ não tem tantas ligações com o universo do Batman. Um dos poucos conhecidos que aparece é o promotor Harvey Dent (futuro Duas Caras). O julgamento traz personagens que apareceram nos filmes anteriores, como o anão Gary (Leigh Gill) ou a vizinha Sophie Dumond (Zazie Beetz)

Por outro lado, o filme se esforça para transformar Arthur Fleck em uma vítima da sociedade. A própria advogada dele usa isso como estratégia de defesa, embora ela mesma não acredite em uma absolvição. Além disso, em meio a entrelinhas que envolvem celebridades, sensacionalismo e redes sociais, há uma triste constatação. Mesmo um criminoso ou um maníaco pode ter um exército de fãs ou seguidores sem noção dispostos a tudo por ele. E, mesmo que esse criminoso saia de cena, outro ainda pior pode tomar seu lugar. Podia ser só um delírio, mas a realidade está assim mesmo.

As Cartas

O Coringa
Arthur Fleck (Joaquin Phoenix)
Criminoso condenado por cinco assassinatos – incluindo o do apresentador de TV Murray Franklin ao vivo pela televisão. Vive em sua dualidade entre o sofrido Fleck e o palhaço Coringa.

A rainha
Harleen Quinzel (Lady Gaga)
Interna do Arkham, e sabedora da história de Fleck. Apaixona-se por ele quando o vê pela primeira vez e torna-se uma seguidora devota. Diz entender completamente a mente do sujeito.

O rei
Jackie Sullivan (Brendan Gleeson)
Chefe de guarda do Asilo Arkham. Trata mal todos os prisioneiros, mas tem certa condescendência com Arthur Fleck, a ponto de leva-lo para aulas de música em uma ala de segurança mínima.

O valete
Ricky (Jacob Lofland)
Jovem e magrelo detento do Arkham. Sua primeira experiência sexual é um “selinho” que o Coringa dá dele. Acaba virando um seguidor fiel, inclusive com cânticos de exaltação.

O ás
Maryanne Stewart (Catherine Keener)
Advogada de Arthur Fleck. Em sua estratégia de defesa, tenta fazer com que ele dissocie sua personalidade mentalmente frágil da personalidade do Coringa, esse sim um perigo para a sociedade.

O dois
Harvey Dent (Harry Lawtey)
Promotor público de Gotham City, é a parte acusadora no julgamento e pede a pena de morte para Fleck. A título de curiosidade: no futuro, Dent tem parte do rosto destruída e vira o vilão Duas Caras.