Nas estreitas ruas do Bairro Alto e da Mouraria em Lisboa, ou nas vielas do Porto e de Coimbra, a vida segue calma seu curso, apenas agitada por algum jovem afoito que tomou uns copos a mais na espera pelo fado. Portugal ainda ocupa uma posição secundária na União Européia e parece cada vez mais distante da vizinha Espanha que deu saltos de qualidade e rejuvenesceu a olhos vistos, mas sua economia é sólida e incomparavelmente melhor do que há quase 22 anos quando entrou para a Comunidade que hoje conta com 27 associados.
Neste mês de outubro, duas más novas abalaram o país. A mais séria revelou que é o 3º colocado no negativo ranking do desemprego na zona do euro, acima apenas de França e Grécia (respectivamente 8,6% e 8,4%), mas nestes as taxas estão melhorando ao contrário do que ocorre em Portugal que pela primeira vez alcançou uma posição pior do que a dos espanhóis. Nada por demais preocupante, se pensarmos no Brasil, mas a taxa de 8,3% é mais que o dobro da vigente nos cinco líderes – Dinamarca, Holanda, Chipre, Lituânia e Áustria – onde a média de 3,8% indica uma situação que na prática é de pleno emprego. As razões parecem residir na adaptação lenta à nova economia mundial e ao investimento das empresas em aumento de produtividade com demissões, ou seja, com produção estacionária. No entanto, o português comum culpa a invasão de ucranianos, moldavos e outros da ex-Europa Oriental, que se somam à costumeira de brasileiros, angolanos e moçambicanos, reforçando seus sentimentos de xenofobia.
Já o sistema de saúde luso foi classificado em um desonroso 19º lugar entre 29 nações segundo o Índice Europeu do Consumidor de Serviços de Saúde produzido pela agência sueca Health Consumer Powerhouse. A melhor estrutura, do ponto de vista dos pacientes, é a da Áustria (806 pontos de um máximo de 1000), seguida muito de perto por Holanda, França, Suíça e Alemanha. Nessa edição, os cinco primeiros seguem o modelo “bismarckiano” que se baseia num regime de seguridade social no qual as empresas ou entidades seguradoras estão sob gestão de empregados e empregadores. Superaram por pouco os escandinavos que adotam o sistema público financiado via impostos. A Inglaterra com 581 pontos ficou quase tão mal classificada quanto Portugal (570), ambos muito prejudicados por deficiências nas avaliações sobre tempo de espera, acesso a medicamentos e “generosidade” de seus sistemas (% de cirurgias de catarata, tratamento odontológico, transplante renal).
A boa notícia veio do setor energético, com os acordos firmados pela GALP – Petróleos e Gás de Portugal S.A. – com os venezuelanos da PDVSA, a brasileira Petrobrás e a angolana Sonangol. A médio prazo, associando-se à exploração de reservas da bacia do Orinoco e participando de licitações em blocos petrolíferos no Brasil e no país africano, a perspectiva é de assegurar o fornecimento de 30% das necessidades portuguesas de combustíveis.
Os investimentos lusos no Brasil são crescentes e empresas como o grupo Pestana (hotéis), Sonae (shoppings), Somague e Brisa (estradas), Cimpor (cimento), Portugal Telecom e Banco Espírito Santo, p.ex., declaram-se satisfeitas com os negócios apesar dos sérios problemas de segurança que obrigam seus diretores a adotar medidas extraordinárias de proteção. A criminalidade em cidades como Rio e São Paulo é tema constante nos jornais de Lisboa, como em recente edição do Diário Econômico que dedicou duas páginas a “Como sobrevivem os empresários à violência no Brasil” e “Segurança privada movimenta 10% do PIB brasileiro”, para informar que empresas deste setor já empregam 1,5 milhão de pessoas.
A política na terra de Camões tem o saudável costume de manter o equilíbrio entre a direita, que fornece o presidente Cavaco e Silva, e a esquerda de José Sócrates, o 1º Ministro que é do Partido Socialista. O Partido Social Democrata ao qual pertenceu o Presidente (hoje Cavaco é independente), na verdade é oposição e acaba de renovar sua direção escolhendo em duras eleições internas ao populista Luís Felipe Menezes, mesmo não sendo da capital e sim de Vila Nova de Gaia, em frente à cidade do Porto. O PSD tentará uma missão considerada impossível: vencer o pleito legislativo de 2009, derrubando o favorito Sócrates, cujo governo é apoiado pela maioria por ter reduzido o déficit público com seu Pacto de Estabilidade e Crescimento. E Lisboa se prepara para a Cúpula Europa&África de dezembro tendo de resolver o impasse da presença de Robert Mugabe, o ditador do Zimbábue, o que significaria a ausência da Inglaterra.
Nossos amigos lusitanos divertiram-se um bocado ao noticiar a demissão do gerúndio por decreto promovida pelo governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, e passaram a chamar Felipão de “Socolari” condenando-o pela agressão ao sérvio Dragutinovic, aumentando a pressão para sua substituição por José Mourinho que recém deixou o Chelsea. No frigir dos ovos, brasileiros e portugueses continuam mais próximos do que nunca. 
       


Vitor Gomes Pinto
Escritor, analista internacional
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